Temerário afirmar, desde quando se iniciou a mediação e a arbitragem entre os homens, sabe-se que tais institutos perdem-se nos escaninhos da história imaginária, inventada, real, bem como nos mais antigos costumes.
Quando o homem, como indivíduo, por instinto de sobrevivência passou a viver em bandos (como a grande maioria dos animais), quer para desfrutar da companhia de outros da mesma espécie, quer para defender-se uns aos outros do meio hostil de então, que os conflitos já existiam. Decerto que nesta oportunidade, não havia mediação e nem tampouco a arbitragem, acredita-se na prevalência do mais forte sobre o mais fraco.
Ao longo (para nós) caminho percorrido pela humanidade, as disputas e os conflitos foram sendo resolvidos das mais diferentes formas, desde decisões impostas pelos curandeiros e feiticeiros, que liam suas sentenças e desígnios nas vísceras de animais, em fatos naturais (chuva, relâmpago, raios ou trovoadas, secas, etc), atribuindo tais ocorrências a virtudes ou culpas, de grupos ou de indivíduo isoladamente.
Depois, quando determinados grupos criavam conselhos grupais, via de regra integrado pelos mais velhos e experientes, ou dotados de alguma característica excepcional para o padrão da época, tais conselhos impunham suas decisões, quer para um indivíduo isoladamente, quer para todo o grupo.
Quando a coletividade organizou-se de uma forma mais complexa, advindo o ESTADO poder (pequenos grupamentos, vilas, etc), este ESTADO avocou para si o direito de julgar e de punir. Embora considerado como um marco considerável nas relações humanas, ainda assim a mediação e arbitragem, acredita-se, ainda não existiam.
Com o advento das nações, seguido da sempre e obrigatória e necessária, relações comerciais entre os povos, povos estes não só de línguas e costumes diferentes, mas e principalmente, regidos por formas diferentes de leis e normas, quer escritas ou não, surgiu o conflito e com o conflito a necessidade de mediá-los, pois a força e a lei de um povo ou nação, não servia para dirimir os conflitos de povos e nações diferentes.
A princípio as normas de comércio sequer escritas, serviram de parâmetro para dirimir as primeiras mediações, escolhidos para mediá-los pessoas comuns ou não, que nem sempre conseguiam chegar a bom termo. Portanto, a necessidade de uma decisão, por pessoa que não representasse obrigatoriamente um povo ou outro, um ESTADO ou OUTRO, surgindo então os arbitradores, cujas decisões, via de regra, não detinham o poder de império, o poder de prevalecer sobre a vontade das partes, necessitando, ainda, na maioria dos casos da tutela estatal, devendo tal laudo arbitral ser homologado.
O Código Comercial Brasileiro, a lei mais antiga a vigir em nosso meio, traz no seu art. 95, que “Em todos os casos em que forem obrigados a pagar às partes falta de efeitos, ou de quaisquer outros prejuízos, a avaliação será feita por arbitradores”. O Código não faz menção de como tais arbitradores eram nomeados.
Após tal menção legal, somente se tem conhecimento de voltar ao assunto com o advento da Lei nº.9.307/96, que dispõe sobre a arbitragem, como é apresentada formalmente, havendo outros institutos legais, de forma quase que genérica, apontando-a como possível e passível de solução de conflitos (Código de Defesa do Consumidor, sistema Financeiro Imobiliário, Transporte Multimodal, etc).
Quando em determinada ocasião, a frase pronunciada “a pena de morte foi um grande referencial na evolução da sociedade”, os que a ouviram ficaram estarrecidos, pois quem a pronunciara era a Juiza Federal no Estado do Rio de Janeiro Denise Frochard, conhecida e reconhecida pela seu vasto conhecimento jurídico e correição nos seus procedimentos.
Quando pela mesma foi acrescentado que tal pena, fora o início do ESTADO como único ente real, legal e empossado no direito de fazer justiça, desaparecendo no véu do tempo a Lei de Talião e muitas outras. Mas na sociedade moderna e globalizada, o ESTADO já não mais cumpre seu papel, tão grande é o número de demandas que lhe são apresentadas e tão emaranhado é o cabedal de leis, regulamentos, etc. etc., tornando infinita a duração de um conflito.
Retornando ao princípio, onde se acredita que a mediação e a arbitragem surgiram da relações de comércio, vital é salientar, que mesmo havendo um ou vários conflitos de interesses, nem sempre ou quase nunca, o interesse maior, o objetivo central é o fim e término das relações de comércio, o que na verdade se quer, o real objetivo, é que seja solucionado o conflito e que as relações prossigam e durem. Daí não restava senão outro caminho senão a mediação e a arbitragem.
Para dar maior garantia e estabilidade nas relações comerciais, principalmente as internacionais, uma vez que as nações possuíam organismos legais estatais próprios para dirimir os conflitos internos, é que foram firmados diversos compromissos internacionais, citando-se dentre eles:
Protocolo de Genebra – 1.923
Convenção de Nova York – 1958 – Ratificada p/Dec.4.311/2002
Convenção Interamericana do Panamá – 1975 – Ratificada em 1995
Embora tais compromissos e acordos internacionais, tenham sido ratificados no Brasil, somente com o advento da Lei nº.9.307 de 22/11/1996, é que finalmente a ARBITRAGEM ganhou autonomia efetiva, onde ficava perfeitamente delineado e delimitado o poder atribuído ao ÁRBITRO e ao
JUIZ ESTATAL.
Descer a comentários técnicos sobre a lei em si em nada contribuirá ao presente raciocínio, mas decerto que se faz necessário, alongar sobre alguns aspectos, do que pode ser arbitrado, quem poderá efetuar tal arbitramento, quais são os limites da arbitragem.
O princípio geral da arbitragem traz que todo e qualquer direito disponível poderá ser submetido à arbitragem, desde que seus titulares sejam capazes na forma da legislação civil.
Qualquer pessoa capaz poderá ser o árbitro, desde que escolhido livremente pelos titulares dos direitos disponíveis, podendo ainda ser pessoas vinculadas a entidades arbitrais, desde que esta seja escolhida pelas partes.
Os limites da arbitragem, são àqueles impostos nas regras apontadas pelas partes diretamente, ou indiretamente quando escolhem entidades arbitrais, não podendo em nenhuma hipótese ultrapassar e nem tampouco se sobrepor à vontade das partes, às leis e aos bons costumes.
A Lei de Arbitragem ao consagrar finalmente tal instrumento em nosso país, deixando de ser submissa ao poder estatal, não mais necessitando a arbitragem nacional ser submetida à homologação estatal, desde que preenchida as formalidades devidas.
A legislação ora existente, embora aparentemente curta é bastante precisa e explicita de forma clara, como e onde deve ser aplicada a arbitragem, os seus limites e a sua independência do poder estatal, as necessidades básicas e devidas para sua efetiva funcionalidade, bem como a obrigatoriedade de requisitos essenciais da sentença arbitral, oportunizando não só a solução do conflito, mas a continuidade da relação entre as partes envolvidas no mesmo.
Por ser via de regra, instância única e sem capacidade de interposição de recurso, necessita basicamente para sua real aplicabilidade e aceitação, de uma mudança cultural implantada em todos os países latinos, que ao se aproximarem mais do direito romano em detrimento ao chamado direito saxônico, enquanto estes buscam de toda a forma dirimirem seus conflitos fora da seara estatal, àqueles tudo levam para a seara estatal.
Célebre é a frase do camponês, que ao recusar vender seu sítio ao Imperador da Alemanha, que tentou usar de sua posição para impor a sua vontade, afirmou: ainda existem juízes em Berlim !.
Quando de forma efetiva e prática, a mudança cultural nos mostrar que a seara estatal não é o melhor local para solução de conflitos, mas sim o local ideal para suas prorrogação infinda e o término imediato das relações entre os titulares de direitos disponíveis, aí sim poderá se afirmar que se passou para a fase adulta da arbitragem.
Fonte: Autor – Reginaldo Correia More